Um pouco de humor nunca é demais
Foi em uma segunda-feira, dia que para muitos a preguiça e o mau humor predominam. O ônibus da linha Lapa / Estação Mussurunga fazia seu trajeto como de costume, até parar em um ponto e uma pessoa dizer:
- Eu sou instrumento de escola de samba, para você tocar no meu pandeiro?
Os passageiros procuram para saber quem reclamava, até que ela entrou no coletivo. Com aparência engraçada, no estilo da Nega-Maluca e com cabelo black power louro, ela chamou atenção. Brincando, disse que era mulher do cobrador, que fez o teste de DNA e o resultado deu positivo. Iam nascer gêmeos. Os passageiros voltam-se para o cobrador sem entender nada. Ela ia se apresentar melhor até que seu celular tocou:
- Alô! A cobrar, ô miseria. Quem é? Você me liga a cobrar para dizer que é Raoney? Ah, oi, Raoney. Onde é que eu “tô”? “Tô” na palestra. Que barulho é esse? Do datashow. Não, não é de ônibus, eu não ando de ônibus porque é coisa de pobre.
Enquanto isso, os passageiros prestavam atenção na conversa. Até que a figura, com humor, dá uma lição de moral.
- Ô, Raoney, aí os passageiros sentam no lugar dos idosos, gestantes, deficientes? É por que aqui eles sentam.
Um “ui” ouve-se dos passageiros.
E ela continua:
- Aí os homens sentam de perna aberta? Aqui eles sentam e ocupam o espaço todo. Que coisa feia!
Em clima de descontração, ela solta mais uma reflexão, agora, falando para os passageiros:
- Vem cá, gente! O prefeito quer mudar o transporte, vocês “tão” sabendo dessa conversa de Modal, VLT, essas coisas? Eu não entendo, a gente que patrocina o transporte público e nem perguntam qual meio é melhor para gente.
Os passageiros reagem com um “poxa, é mesmo”.
A figura volta a pegar no pé do cobrador, conta histórias engraçadas e faz todo mundo rir. Em meio à conversa, diz que tem 13 filhos, todos de pais diferentes e explica que trabalha porque quer, já que tem duas casas no caminho das Árvores e completa:
- Tenho duas casas no Caminhos das Árvores....para fazer faxina amanhã.
Todos riem.
O ônibus freia bruscamente, quase bate em outro veículo, mas os passageiros parecem anestesiados e só querem saber de interagir com ela.
A figura a qual me refiro é um homem vestido de mulher. De nome Rosamunda. Um ele. Uma ela. Um ele/ela que fez todo mundo rir desde a sua entrada no coletivo.
Depois de muita piada, chega o momento de pedir contribuição financeira. E não é que as pessoas contribuíram?
A quantidade de pessoas que ajudaram é de dar inveja a qualquer vendedor de amendoim. E o humor não para por aí. Passando pelo estreito corredor do ônibus, ela vai com seu saco de moedas e brinca com quem está à sua frente, ao lado, atrás...não tinha lugar certo para a perturbação acontecer.
Dava para ver a alegria estampada no rosto de cada passageiro, ainda que momentâneo, mas aqueles 10 minutos fizeram muitos esquecerem dos problemas.
Chega a hora da Rosamunda se despedir. Primeiro ela agradece, fala da importância do humor, depois desce do ônibus e chama, mais uma vez, a atenção de quem passa pelo local. Ah, mas antes de ela descer, deixou mais um recado:
- Cobrador, a chave de casa tá debaixo da lata de leite, vê se não chega tarde.
O cobrador aprova a brincadeira com um sorriso tímido. E ela completa:
Tem muita gente me queixando. Quem quiser contato comigo, meu endereço é Rua do sobe e desce, número desaparece, moro no 2º andar porque o 1º caiu.
Aí sim ela se despede e deixa um vazio dentro do coletivo que volta à sua rotina.
Brenda Gomes
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